“Eu não tinha essas mãos paradas, frias e mortas; Eu não tinha esse coração que nem se mostra; eu não dei por essa mudança tão certa, tão simples, tão fácil; Em que espelho ficou perdido minha face?”
Cecília Meireles
O presente artigo é um requisito do Eixo de Gestão e Avaliação de Políticas, Programas e Projetos Sociais. Tem como objetivo articular a teoria estudada em sala de aula com o tema Envelhecimento Populacional no Brasil. Como os sujeitos estão envelhecendo na atualidade? Que velhices estão sendo produzidas na contemporaneidade? Essas são questões que nos atravessam e nos afetam de modos diferenciados, exigem uma nova escuta e precisam ser melhor elaboradas, até para que possam ser respondidas.
Diversas vezes, vemos manchetes em nossos jornais, de idosos comemorando seu centésimo aniversário, isto hoje em dia é olhado pela população com certa naturalidade, entretanto, se isto ocorresse em um passado não tão distante, seria visto como um fato isolado e celebrado praticamente como um milagre. Esta mudança de olhar deve-se ao aumento da expectativa de vida dos brasileiros. De acordo com o Censo 2000, tendo como fonte o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o percentual de pessoas com mais de 60 anos chega 10,1% da população em geral, isto é, aproximadamente 17 milhões de brasileiros. Considerando a continuidade das tendências verificadas para as taxas de fecundidade e longevidade da população brasileira, as estimativas para os próximos 20 anos indicam que a população idosa pode chegar 30 milhões de pessoas ao final deste período, chegando a representar quase 13% da população. Analisando os dados do Censo 2000 verificamos que a relação idoso/criança mostra que a proporção de idosos vem crescendo mais rapidamente que a proporção de crianças: de 15,9% em 1980, passou para 21,0% em 1991, e atingiu 28,9%, em 2000. Em outras palavras, se em 1980 existiam cerca de 16 idosos para cada 100 crianças, 20 anos depois essa relação praticamente dobra, passando para quase 30 idosos por cada 100 crianças. Diante disto resta a nós pensarmos, há alguns anos, éramos considerados um país de jovens, mas estes jovens se tornaram adultos e caminham para o envelhecimento. Mas será que estamos nos preparando para este envelhecer ou nos tornaremos uma população de “velhos”?
O envelhecimento é um processo pelo qual todo ser vivo passa, ninguém acorda velho de um dia para o outro. Processo este, que se formos avaliar ocorre desde o dia de nosso nascimento. Mas infelizmente, muitas pessoas não conseguem enxergar desta maneira devido à imagem equivocada que têm do idoso e do envelhecimento. “Percebe-se que na atualidade é negado ao velho sua função social, uma vez que habilidades como aconselhar e lembrar são mecanismos não valorizados, sendo decorrente da opressão à velhice. Esta se dá a partir de mecanismos institucionais visíveis como, por exemplo, as casas de ‘repouso’, asilos, bem como por questões psicológicas (a tutelagem, a inexistência do diálogo, discriminação) e mecanismos científicos com pesquisas que demonstram deterioração física, deficiência nas relações interpessoais” (Chauí, 1994). A falta de crédito em relação ao idoso faz parte de nossa cultura onde tudo de bom é para o jovem e o de ruim fica para o velho como o desrespeito, doenças, invalidez e muitas outras situações. Quando algum idoso consegue sair do "padrão" estipulado pela sociedade voltando a estudar, praticando esportes radicais, ou até se casando na terceira idade, as pessoas levam o caso com uma mistura de repulsa e fascinação. E está aí a grande diferença entre envelhecer e ser velho.
O processo de envelhecimento está muito mais ligado a uma questão interna do que a fatores externos como, por exemplo, com passar do tempo há o aparecimento de doenças, rugas na pele e tudo relacionado ao que se chama de “velhice”. Na verdade, o envelhecimento, em toda a essência do seu significado, não existe. Nós é que nos envelhecemos. Não que se neguem os efeitos reais da idade. Lógico que eles existem, mas as pessoas que ficam tristes porque estão envelhecendo é porque deixaram suas almas envelhecerem.
Envelhecer feliz não significa conservar a juventude, mas conseguir, através de escolhas assertivas, a satisfação na terceira idade. O envelhecimento não acontece de uma forma padronizada para todas as pessoas, portanto não existe uma fórmula especifica para envelhecer de forma bem sucedida. Porém, é necessário que os indivíduos mantenham projetos de vida sempre, pois a chegada da terceira idade envolve mudanças de papéis, ajustamentos e talvez a mais difícil das adversidades que acompanham o processo do envelhecimento: a discriminação social, que em grande maioria é iniciada dentro de um ambiente familiar agressivo e conflituoso.
A exclusão social que o idoso enfrenta está relacionada aos conceitos negativos provenientes da sociedade. O estigma de que “lugar de velho é na cadeira de balanço”, não permite, nem estimula que o idoso enfrente os desafios, e assim limita e regula suas condutas. Na nossa sociedade, a valorização do ser humano está ligado à sua produtividade, razão pela qual a aposentadoria representa um momento crucial na vida do indivíduo. “A aposentadoria na terceira idade representa um momento no qual o sujeito deve redefinir sua vida, ao mesmo tempo em que deve assumir sua velhice... Portanto para uma sociedade que idolatra o trabalho e produção em deternimento do homem, a aposentadoria passa a ser, para muitos, a perda do próprio sentido da vida, comumente caracterizado como uma morte social. Aposentar-se representa para o sujeito não uma progressão na vida, mas uma constatação de fim... “ (Costa, 2007).
O envelhecimento da população requer políticas de saúde específicas para esse segmento, voltada para a manutenção da capacidade funcional do idoso, como alerta Renato Veras (2000): Quando o idoso procura o serviço de saúde ou o médico com uma queixa específica, é preciso investigar e avaliar o risco de diversas patologias, usarem métodos epidemiológicos, acompanhar e avaliar o uso excessivo e simultâneo de medicamentos, priorizarem a prevenção, preferir os cuidados domiciliares às internações, buscar o acompanhamento de um “cuidador” para o idoso.
As políticas de governo na área da saúde só agora começam a despertar para as questões do idoso, repensando procedimentos no Sistema Único de Saúde, interferindo na regulação dos planos de saúde particulares, avalia Renato Veras (2000). Em sua opinião, o crescente custo social e dos cuidados com a saúde dos idosos devem ser enfrentados com mudanças de prioridades nas políticas de saúde e seguridade, de forma que o custeio da seguridade não dependa apenas das contribuições dos trabalhadores e de parte do que é devido às empresas. O governo deve investir menos em bancos e em grandes obras, e sim contribuir mais para com o orçamento da previdência, além de fiscalizar o recolhimento das empresas, combatendo a corrupção e garantindo mecanismos de controle social desta poupança.
Diante de tantos ajustamentos que estes indivíduos enfrentam, é importante ressaltar que o apoio famíliar é essencial para transpor as barreiras e permitir o sentido da vida, dando assim continuidade ao desenvolvimento como pessoa. O respeito e o carinho da familia, fazem com que o envelhecimento não seja tão amedrontador, não sendo encarado como a preparação para a morte e sim mais uma etapa para se continuar evoluindo e vivendo. O grau de dependência ou independência dependerá dos modos como nos relacionamos com as pessoas e com a vida, bem como de como respeitamos os limites do nosso corpo e da nossa mente. Envelhecer é um processo continuo, portanto, será resultado dos nossos atos e pensamentos ao longo da vida.
Só conseguiremos mudar a imagem com relação à velhice e ao envelhecimento, quando pensarmos de forma diferente. Quando acreditarmos que envelhecimento é um processo e não um castigo. Quando tivermos um novo olhar com relação ao tempo e a história que ele nos ajuda a escrever. O mais importante é não negar e sim, viver a terceira idade com força, emoção, grandeza e vitalidade. Não nos entregando. O direito de sonhar ainda não acabou! Não deixe que as homenagens sejam feitas apenas no dia do idoso, mas que sua vida seja uma homenagem à humanidade de quem não desistiu e continua lutando pelo próprio bem estar, porque “Envelhecer é um presente e ficar velho é uma opção”.
Vanessa Azevedo,
Setembro de 2007
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